Vocês pediram e eu demorei UM ANO para trazer, mas aqui está minha crítica de Gachiakuta. Como eu fiz com Kaiju no.8, decidi dividir as críticas em partes – comentando assim o arco de introdução separadamente do segundo arco da série (“Vandals Trap”), arcos que correspondem aos volumes 1, 2 e 3. O terceiro arco ainda está acontecendo, por isso irei escrever uma análise assim que for encerrado (estou planejando também escrever mais críticas sobre arcos de outros mangás, já que coloquei muitas leituras em dia nesses últimos três meses).
Para quem não conhece, Gachiakuta é um Battle Shounen da Shonen Magazine, escrito e desenhado por Kei Urana. Esse é o primeiro mangá do autor, que anteriormente trabalhou como assistente de Atsushi Ohkubo, autor de Soul Eater e Enen no Shouboutai. Gachiakuta conta a história de um garoto, Ludo que é um catador de lixo no “Paraíso”. Diferente dos outros cidadãos do Paraíso, que tratam o lixo como algo sem valor, Ludo vê a importância e a alma de todos os objetos. Gachiakuta se concentra, nos primeiros capítulos, principalmente na relação entre o que “tem valor” e “o que não tem valor” para a sociedade.
Essa crítica terá uma CONCLUSÃO Spoiler-Free, contudo a discussão dos arcos terá spoilers. Por isso, se vocês estiverem interessados em saber se vale a pena ler a série, sem ter nenhum spoiler, recomendo ir diretamente a conclusão. Caso vocês queiram saber em detalhes minha visão sobre os capítulos da série, recomendo ler a crítica como um todo, para assim terem uma ideia completa do meu pensamento sobre a obra.
Deixem nos comentários recomendações de leitura e de matérias. Sem mais delongas, vamos para a crítica.
Capítulo 01 – 11: “Introduction Arc”
Com um primeiro capítulo de 73 páginas, deu logo para perceber que os editores da Shonen Magazine tinham uma grande expectativa sobre o mangá – e era uma expectativa merecida, pois já no primeiro capítulo, a série consegue apresentar um mundo interessante. Enquanto discute sobre “o que realmente tem valor”, o autor vai nos mostrando os problemas do “Paraíso” , vai desenvolvendo a personalidade anárquica do protagonista e a sua relação com seu pai adotivo. Todos os elementos apresentados no primeiro capítulo culminam em uma sequência espetacular no qual vemos o homicídio do seu pai adotivo, a condenação injusta de Ludo e a sua pena, que foi ser lançado no enorme lixão da cidade – um buraco de muito metros de altura que leva à um submundo, o “Purgatório” –
O autor trabalha nesse primeiro capítulo elementos que vão além do “valor das coisas”, trabalha a questão do PRECONCEITO e da INJUSTIÇA, e faz o seu leitor refletir. No exato momento que tratamos certas coisas ou certas pessoas como sem valor, sem alma, acabamos também julgando-as como sujas, inúteis, desprezíveis; justificando as injustiças que cometeremos com essas mesmas pessoas, como a ausência de um correto julgamento e o não respeito dos seus direitos civis e humanos. A realidade é como os objetos que resgatava, o protagonista Ludo foi simplesmente jogado no lixão, esquecido pela sociedade que sempre o abandonou.
Os capítulos seguintes de Gachiakuta cobrem a “queda” de Ludo do “Paraíso” para o “Purgatório” e introduzem o conceito de “Givers”, “Personarma” e “Limpadores” para os leitores, apresentando assim os elementos básicos do universo Battle-Shounen da série. A narrativa é coesa, mesmo que o autor nos primeiros cinco capítulos exagere nas personalidade dos personagens (São sempre ao “extreme”, comunicando na base do grito e da histéria). Isso acontece também por causa da personalidade anárquica do protagonista, mas muitas vezes o que deveria ser engraçado, se tornou irritante, por causa da ausência de um diálogo lógico ao longo dos primeiros capítulos.
E isso acaba interferindo um pouco no carisma do protagonista; eu gosto do Ludo, mas nos primeiros cinco capítulos, era insuportável. Sim era justificável a sua raiva, levando em conta a situação no qual o herói se encontrava, mas eu não estava aguentando. Por sorte, após o sexto capítulo, o autor vai moderando a sua raiva, o seu anarquismo – utilizando, de modo inteligente, os ensinamentos do pai adotivo para justificar a gradual mudança de personalidade -. Provavelmente esse elemento de raiva ainda vai retornara ser um ponto importante da narrativa, pois Ludo carrega em si um grande ódio pelo Paraíso, mas isso é algo que veremos ao longo da série.
O desenvolvimento do universo mesmo não sendo espetacular, é interessante: O design dos monstros não são inovadores, a ideia de givers e organizações de “heróis” é já visto, e por fim o uso das “personarma” não chega a me surpreender – contudo, o que deixa o universo realmente interessante é a carga emocional que carrega. A relação entre o “Purgatória” e o “Paraíso”, esse na minha opinião é o ponto forte de Gachiakuta; pois guia toda a discussão moral da história.
Na verdade, tem um segundo ponto forte que está presente em TODOS OS CAPÍTULOS – a arte e o design de personagens – esses dois elementos conectados rendem Gachiakuta um mangá especial. Pois, o autor, além de saber narrar muito bem as cenas de ação, dando uma correta diagramação nos quadros, também entrega páginas lindíssimas (Sim, dá para perceber que Kei Urana não gosta muito de páginas duplas, mas isso não estraga a leitura). Os personagens tem um design muito bonito, com olhos expressivos, roupas e máscaras estilosas e corte de cabelo chamativos – dando assim uma identidade própria para cada personagem relevante -. Podemos neles e nas armas a CLARA inspiração em Soul Eater.
Os personagens secundários, inclusive, são na minha opinião um dos pontos mais positivos da série, pois são todos carismáticos, bem desenhados e com uma personalidade clara. Até mesmo o personagem de “Support” que vemos em muitas cenas usando a máscara, acabam tendo uma grande importância por causa da temática da série: “O valor do que ignoramos” – Normalmente personagens de suporte não tem valor, mas em uma série sobre “lixo” e “esquecidos”, nada melhor do que dar uma atenção a essa classe muitas vezes desprezada.
Kei Urana entrega um primeiro arco convincente, com pequenos defeitos que não estraga a leitura. Consegue apresentar bem os conceitos principais da séries, que mesmo não sendo criativos, são bem funcionais e enriquecem o universo da série, que na minha opinião pode se tornar um dos elementos mais interessantes da série – principalmente quando for melhor desenvolvida as tensões políticas entre o Purgatório e o Paraíso, quem até mesmo, uma guerra entre os dois mundos pode acontecer -.
Nota: 8 / 10
Capítulo 12 – 22: “Vandals Trap Arc”
Já no segundo arco, o autor deixa de lado todos os questionamentos sobre a moral para entregar um arco mais voltado para “a pancadaria” – não esquecendo, porém, de desenvolver o protagonista -. Nesse arco temos a apresentação do “grupo” rival dos limpadores, os vândalos e também conhecemos um dos vilões da série: Jabber Wongar que tem a habilidade de controlar o veneno, tanto a sua letalidade quanto a sua durabilidade.
Infelizmente tanto o poder quanto a personalidade do vilão não é nada de novo, lembrando MUITO o “Stain” de “Boku no Hero Academia”, mas mesmo assim consegue atuar a sua função narrativa muito bem, que era levar Ludo ao limite do seu estresse, ao ponto de explodir, revelando o seu real poder. Ás vezes criar um personagem funcional a narrativa é melhor do que criar um personagem único que não ajuda em nada a movimentar a história.
Como já eu disse, o autor utiliza esse arco para desenvolver um elemento que aparece no primeiro capítulo: a sensação de inutilidade e de incapacidade que o protagonista sente. Após ver o seu pai adotivo morrer e após não conseguir lutar contra os inimigos do primeiro arco, Ludo começa a se questionar sobre a sua capacidade de proteger quem ama. Esse colocar-se em dúvida resulta em uma explosão de poder quando um dos personagens de suporte vem empalado vivo pelo vilão desse arco.
Essa sequência de dois capítulos no qual vemos o “sacrificio” do suporte e a transformação de Ludo é simplesmente espetacular – tanto no ponto de vista de roteiro, já que é muito bem escrito quanto no ponto de vista artistico, no qual o autor mostra a sua habilidade de rabisco, de usar o negativo e também de transpor as emoções. Simplesmente espetacular -. Essa sequência elevou a qualidade do arco e deu uma intensidade que era necessária para dar uma relevância à um arco que na verdade é muito genérico.
Sim, você sabe que Gachiakuta mesmo sendo um bom mangá, entregou um segundo arco genérico com momentos memoráveis. O que quero dizer com isso: A estrutura do arco, a personalidade do vilão, o poder do vilão, as cenas de luta, no geral eram muito previsíveis, mas a arte espetacular nos fez, muitas vezes ignorar voluntariamente essa previsibilidade. Até mesmo deixei de lado que o autor não teve a coragem de matar o personagem de suporte, por causa da ótima arte somada a capacidade de Kei Urana de desenhar quadros claros, com cenas de luta bem desenvolvidas (Gostei muito da sequência no qual Ludo e Zanka lutam juntos contra o vilão).
Talvez o que mais pesou para eu não ter amado esse arco e sim ter simplesmente gostado, é que não teve um grande desenvolvimento do universo que circunda a série, que era um dos elementos mais originais da série. Não estou dizendo que a série deve SEMPRE desenvolver o universo. Esse arco mesmo tem sua utilidade no progredir da história, pois apresentou um importante vilão, deu indício de quem será a primeira grande antagonista da série, desenvolveu o protagonista e revelou o seu real poder, mas na minha opinião apresentou isso de modo um pouco genérico, mesmo continuando bom (e muito, mas muito bem desenhado, que arte meus amigos!)
Nota: 6 / 10
Conclusão
Gachiakuta, na minha opinião, prova que mesmo não sendo completamente originais e carregando vários clichês do Battle-Shounen, ainda é possível SIM entregar uma série de ótima qualidade, com elementos originais, lutas emocionantes, personagens carismáticos e uma arte espetacular. É inegável que os Battle-Shounen de fantasia estão sofrendo para conquistar os leitores da nova geração, mas ainda temos espaço para novas obras de pancadaria.
Todo o seu questionamento sobre o “valor do lixo” que depois evolui para “o valor dos excluídos”, deixa a série mais rica – é um mangá sobre aqueles que estão a deriva da sociedade, sobre os injustiçados, abandonados e esquecidos – É isso que rende Gachiakuta um Battle-Shounen mais interessante de se ler e te fazem ignorar todos os outros elementos clichês que circundam os mangás do gênero.
Gachiakuta acabou sendo para mim uma leitura agradável que eu continuei lendo além dos 22 capítulos já criticados – de fato, eu estou agora seguindo a série semanalmente, pois digo a verdade, Gachiakuta MERECE SER LIDO – Talvez a Weekly Shonen Jump deveria aprender um pouco com a Magazine, que quando viu o potencial de Gachiakuta encheu a série de publicidade e de páginas (todos os três primeiros capítulos tem mais de 40 páginas).
Nota: 7 / 10